quarta-feira, 13 de julho de 2022

CONCRETO PERMEÁVEL: CONCEPÇÃO, MICROESTRUTURA, REOLOGIA NO ESTADO FRESCO, OTIMIZAÇÃO E PROPRIEDADES

 

Marco Antônio de Morais Alcantara

Concepção e microestrutura

O concreto permeável consiste em um arcabouço composto por agregado graúdo e pasta de cimento.

As suas características são: grande índice de vazios, e a cimentação feita através dos contatos entre os agregados, pela pasta de cimento.

Neville (2016) apresenta o concreto permeável sob a designação de “concreto sem finos”; autores podem incluir o agregado miúdo, ainda que em pequena proporção, e algum elemento atuante como fíler; todavia, a participação predominante de materiais granulares sempre persiste, no sentido de ditar as suas composições.

Os materiais constituintes são basicamente o cimento, os agregados graúdos e a água.

As principais influências sobre as suas propriedades do concreto permeável são ditadas pela sua microestrutura, porosa, e, da parte dos insumos, têm-se a influência da relação água/cimento, no sentido de se dar a adesão, e a forma e a graduação dos agregados, no sentido de se influenciar os vazios internos.

As principais propriedades do concreto permeável

A resistência mecânica:

O concreto permeável em a sua resistência mecânica promovida em grande parte pelos agregados, pela massa específica alcançada, e pelo consumo de cimento. Conforme Neville (2016) esta é função da massa específica alcançada, e pode variar segundo valores que vão da ordem de 1,5 a 14 MPa. Existe uma relação com relação ao valor da massa específica e o valor da relação água/cimento.

Deformabilidade:

Para o concreto permeável, este pode ser rígido, variando em função do valor da resistência mecânica. Segundo Neville (2016), para um valor de 5 MPa alcançado na resistência à compressão simples, o valor do módulo é fornecido da ordem de 10 GPa.

Resistência à tração:

Segundo Neville (2016), o comportamento da resistência à tração com relação à resistência à compressão, pode variar diferentemente dos casos dos concretos com finos, onde, este pode chegar em até 30% do valor da resistência à compressão.

Massa unitária:

A massa unitária, segundo Neville (2016), é compreendida pela soma da massa unitária do cimento, dos agregados e da água, podendo variar conforme o nível de adensamento, da ordem de 1600 a 2000 kg/m3, e, em se utilizando de agregados leves, esta pode ser da ordem de 640 kg-m3.  

Retração:

A retração dos concretos permeáveis é menor do que a alcançada para os casos de concretos convencionais, dado ao fato de que este apresenta pouca pasta, e que os agregados exercem um papel de contê-la. Segundo Neville (2016), esta pode variar entre 120x10-6 para casos de umidade normal, e 200x10-6 para casos de umidade baixa.  

Dilatação térmica:

Esta é regida pelo tipo de agregado utilizado, e, segundo Neville (2016), pode variar entre 0,6 a 0,8 com relação à que é apresentada pelo concreto convencional.

Condutividade térmica:

A condutividade térmica pode variar em função do tipo de agregado, e do teor de umidade. Este último tende a favorecê-la. Os agregados leves podem contribuir para que ela seja menor, e, segundo Neville (2016), os valores da condutividade térmica podem variar entre 0,69 a 0,94 J/m2.s.0C/cm, para o caso de agregados leves, e 0,22 J/m2.s.0C/cm para os casos de agregados normais.

Absorção d’água e permeabilidade:

Do ponto de vista da absorção d’água, este material é ditado pelo seu índice de vazios, que pode permitir a absorção de até 25% de sua massa. Pela mesma razão, quanto à sua microestrutura, este material não é dotado de sucção interna. Em termos da permeabilidade, o material é de drenagem favorável.

 

Algumas características de materiais e dosagem para o concreto permeável

Segundo Neville (2016), o consumo de água por metro cúbico de concreto é da ordem de 180 litros.

Quanto aos agregados, estes devem apresentar dimensões máximas entre 10 e 20 mm, com a tolerância de até 5% para partículas maiores, e 10% para os casos de partículas menores.

O envolvimento da camada de cimento sobre os agregados deve ser da ordem de 1,3 mm de espessura.

A Tabela 1, conforme Neville (2016), apresenta alguns valores dos parâmetros de dosagem, associados aos respectivos valores alcançados para a massa específica e a resistência à compressão simples aos 28 dias de cura. Os agregados variam entre 9,5 a 19 mm.  

Tabela 1: Parâmetros de dosagem e valores da massa específica aparente e resistência à compressão simples, conforme Neville (2016)

Relação agregado/cimento, em volume

Relação água/cimento, em massa

Massa específica

(kg/m3)

Resistência à compressão aos 28 dias (MPa)

6

0,38

2,020

14

7

0,40

1,970

12

8

0,41

1,940

10

10

0,45

1,870

7

 

As Figuras 1, 2, 3, 4 e 5 ilustram a variação dos respectivos parâmetros com os valores da resistência à compressão simples. Estas foram elaboradas com base nos dados apresentados na Tabela 1, de Neville (2016)

 

Figura 1: Relação entre a massa específica e a resistência mecânica

 

Figura 2: Relação entre a relação água/cimento e a resistência mecânica

 

Figura 3: Relação entre a relação agregado/cimento e a resistência mecânica

 Figura 4: Relação entre a relação água/cimento e a massa específica

 
Figura 5: Relação entre a relação agregado/cimento e a massa específica

 

Pode-se notar, através da Figura 1, a influência da massa específica para com o valor da resistência mecânica, com base na compacidade oferecida ao sistema. A Figura 2 indica que a natureza da pasta é importante, pois ela pode influenciar nas condições de aderência entre a pasta e os agregados, e finalmente, o conteúdo de cimento é importante, com relação ao conteúdo de agregados, em massa, visto que ele pode aumentar ou diminuir as áreas de contato entre os agregados e a pasta.

As Figuras 4 e 5 podem dar orientações para os pontos de partida das dosagens, visto que as relações água/cimento e agregado/cimento são importantes para a definição das condições reológicas e de possível economia

 

Alguns aspectos tecnológicos da produção do concreto permeável

Para os casos de concretos permeáveis não existem ensaios de validação, tais como nos casos de concretos com finos. A avaliação é limitada a uma inspeção visual.

Do ponto de vista da reologia do concreto fresco, preocupações são manifestadas com a secagem o material, de modo que o tempo entre o preparo e o lançamento seja visto com cuidados.

Preocupações são tomadas também com relação à segregação, caracterizada pelo escorrimento da pasta. Por esta razão, não se executa a vibração do concreto para o adensamento, sendo este realizado por um apiloamento, em especial nos cantos das formas.

O material apresenta baixa coesão nas primeiras idades.

 

Alguns aspectos sobre a otimização de composições, do ponto de vista da reologia

Moura et al (2021) apresentam um estudo de caso para a otimização de misturas de concreto permeável para a produção de fabricados, com a porosidade variando entre 15 a 25%. Como requisitos de desempenho de desempenho, têm-se a resistência mecânica e a permeabilidade.

De modo geral, a relação água/cimento se apresenta importante pois, quando o seu valor é muito baixo, a adesão é muito baixa, e quando ela é muito alta, corre o risco da segregação pelo escorrimento. Um problema apresentado pelos autores é a definição da consistência, com base na escolha da relação água/cimento, de modo a favorecer a fabricação, conferindo a coesão interna de modo a permitir a desmoldagem.

Foram avaliados os comportamentos, quando considerados os valores de 0,28 até 0,40 para a relação água/cimento, e verificados os testes conforme os experimentos propostos em Nguyen et al (2014). As misturas foram submetidas ao peneiramento e vibração durante 15 segundos. O critério diz que, se após a vibração, houver pasta no fundo da peneira, esta não é uma mistura adequada, pois indicaria um excesso de água. Dentro do estudo apresentado por Moura et (2021), a deficiência em água, por sua vez, seria mostrada pela desagregação quando em ensaios de moldagem em prensa hidráulica.

Um outro critério apresentado em Moura et al (2021) é o teste “bola na mão”. Como se intitula o teste, este é feito literalmente preparando uma bola com o material no estado fresco, com o auxílio da pressão deste entre os dedos. Como resposta se pode verificar a presença da coesão interna após liberar a pressão, conferida pelo estado de agregação no caso de haver esta coesão, e podendo vir também acompanhada de outras peculiaridades relativas à esta coesão. No caso dos autores citados, para a relação água/cimento de 0,28 se constatou um menor nível de coesão, enquanto que, para o caso de 0,32 se manifestou um excelente estado de coesão, porém a mistura se mostrou muito pegajosa. Isto dificultaria também a desmoldagem, razão pela qual se adotou a relação 0,30.  

Balbo et al (2022) apresentam alguns princípios de dosagem, com base nos objetivos da dosagem e nos aspectos da otimização:

-O concreto deverá atender a porosidade, condutividade hidráulica, e resistência mecânica com base no tipo de solicitação.

-O consumo de cimento é normalmente elevado, visto que o material é composto basicamente por “agregado graúdo + pasta”. Não existe uma fase constituída por argamassa.

-A pasta deve encobrir todos os agregados, de modo a garantir a eficácia da ligação entre os contatos.

-A consistência do material deve ser seca, mas que apresente um mínimo de coesão interna, que permita a formação de uma “bola” na mão com a pressão dos dedos.

-Deve ter a estabilidade de, quando no lançamento, não ocorrer a precipitação da pasta.

-Não ocorrência de precipitação de pasta sob a forma de segregação, quando na moldagem de corpos de prova, para os ensaios de resistência e de condutividade hidráulica.

Conforme Balbo et al (2022), a dosagem pode se dar pelo método racional/volumétrica, sendo a relação cimento/agregado o fator de controle.

 

A influência de alguns outros materiais nos concretos permeáveis

Pode-se recorrer, por exemplo, ao uso de cinzas para a fabricação dos concretos permeáveis, como apresentado em Rohden et al (2019), assim como, pigmentos, apresentados em Balbo et al (2022), os quais terão o comportamento como fíler, sob os pontos de vista do comportamento reológico. Os objetivos da incorporação de fíler tais como as adições minerais ativas, seriam o de enriquecer a pasta, enquanto que, para os casos dos pigmentos, os objetivos seriam para se atribuir coloração ao concreto.

Nestes casos, se utiliza de superplastificante para se contornar as condições de manuseio.

Um outro aspecto, é quanto ao uso de agregados reciclados.

Alves et al (2016) apresentam a variação do desempenho em um estudo caso envolvendo a substituição dos agregados naturais por agregados produzidos por resíduos de construção, nos teores 5, 10 e 15%, e com o tempo de cura variando em 7, 28 e 56 dias de cura. Para 56 dias de cura, observou-se a diminuição de até 24,25% no valor da resistência à compressão, e um aumento de até 22,82% no valor da porosidade, com o aumento da substituição.  Consideram os autores que houve correlação entre estes dois fatores.

 

Aplicações do concreto permeável

O concreto permeável pode ter aplicações diversas.

Com base em Neville (2016), ele pode ser utilizado na fabricação de paredes e vedações, pois está isento da ascensão capilar, assim como, ele pode ser revestido com argamassa, o que impede as correntes de ar. O material não é recomentado para fundações, porque ele pode absorver água, em até 25% de sua massa.

O concreto permeável pode favorecer a retenção e a infiltração de água para o solo, podendo esta capacidade ser utilizada na fabricação de pisos e pavimentos permeáveis.

 

Referências bibliográficas

ALVES, P.B; SEGANTINI, A.A.S; ALCANTARA, M.A.M. Análise da influência da substituição de agregados naturais por reciclados na resistência e na porosidade de um concreto permeável. In: SODEBRAS, vol 11, 123, 2016, pp. 90-94

BALBO, J.T; MARTINS, J.R.S; CARGNIN, A.P; RIBEIRO, H.L; SILVA, E.R. Concreto colorido e permeável para ciclovias: estudo de dosagem de laboratório. In: CONCRETO & CONSTRUÇÕES, 105, 2022, IBRACON, pp.34-41

MOURA, J.M.B.M; GRUPELLI, I.G; PERAZZOLI, G; LOECHELT, L.K. Método de dosagem adaptado para peças pré-fabricadas de concreto permeável. In: CONCRETO & CONSTRUÇÕES, 101, 2021, IBRACON, pp.94-98

NEVILLE, A.M. Propriedades do concreto. Porto Alegre, 2016, bookman, 888 p.

NEGUYEN, D.H. A modified method for the design of pervius concrete mix. Construction and Buildings materials, v.73, pp. 271-282, 2014

ROHDEN, A.B; XAVIER, L.L; REITZ. R.  Substituição de cimento Portland por cinza de casca de arroz e vidro moído em concretos permeáveis. In: CONCRETO & CONSTRUÇÕES, 96, 2019, IBRACON, pp.94-100