Marco Antônio de Morais Alcantara
O concreto de ultra alto
desempenho (UHPC) tem aproximadamente a idade entre duas a três décadas, com
início no Canadá, com a experiência da construção de uma ponte na cidade de
Sherbrooke. Data de 1997. No início, o nome atribuído a esse material era
“Concreto de Pós Reativos”, em razão dos materiais que fazem parte da sua
composição, como se verá neste texto. Durante
a década de 90 este material foi desenvolvido em diversos países, explorando-se
o atendimento à diversos requisitos. As propriedades relevantes do UHPC são
intríssecas a ele, podendo ser citadas, como o próprio nome diz, a elevada
resistência mecânica à compressão e à resistência à tração, a ductilidade e a
durabilidade.
As propriedades do UHPC são
conferidas com base nos seguintes fatores, relativos à sua composição e à
microestrutura interna. Esta vem em decorrência de um baixíssimo valor da
relação água/aglomerantes, uso de aditivos superplastificantes, otimização das
condições da zona de transição entre a pasta e os agregados, tudo isso conduz a
um elevado fator de empacotamento, ainda têm-se a presença de fibras em
composição.
Como consequência, têm-se que
este material reúne as propriedades dos outros concretos especiais, tais como o
concreto autoadensável, no sentido da mobilidade; concreto de elevado
desempenho de alta resistência, devido às suas superiores capacidades em
absorver esforços mecânicos; e dos concretos com fibras, devido às suas
condições de ductilidade e de tenacidade. Ainda, pode-se citar a capacidade
deste concreto em absorver impactos.
Dadas as características de sua
composição, se destaca que este material não dispõe de agregado graúdo, mas tem
como os materiais de diâmetro máximo as areias que contam com até no máximo 3 mm
como o valor diâmetro máximo. Conta ainda a presença de finos, tais como fíler
e adições minerais, que contribuem para o refinamento e otimização do esqueleto
granular, juntamente com a presença do cimento. A relação água aglomerantes é
extremamente baixa, e a fluidificação é efetivada pela presença e ação do
superplastificante.
A Figura 1 ilustra a
microestrutura de um UHPC.
Figura 1:
Microestrutura do UHPC
Desta forma, são alcançadas as
condições ótimas com relação às condições de empacotamento, favorecendo às
condições de desempenho mecânico, e ainda traz condições que favorecerão as
condições reológicas do material, tais como se evitar bloqueios, vazios e o
efeito parede. O UHPC apresenta excelente condições de moldagem, preenchendo
espaços de fôrmas relativamente estreitas, sem apresentar bloqueios ou
segregação.
A presença das fibras contribui
para a ductilidade, aumento da tenacidade, e da resistência à compressão e à
tração, considerando que este comportamento é de estrutura, independentemente
da resistência da matriz. Não se deve deixar de considerar que as fibras devem
estar em compatibilidade com as condições da matriz cimentícea, de modo que a
trabalhabilidade da mistura não seja afetada.
Materiais e a seleção de insumos para a dosagem.
Dentro da problemática seleção o
de materiais, constam as seguintes observações:
-O agregado pode ser de origem
regional, e até preferível para se evitar custos e transporte, tornando a
solução mais sustentável, e deve-se atender aos índices de qualidade, tais como
a resistência mecânica, grau de sanidade satisfatória, baixa reatividade que
possa contribuir para a desagregação, e as dimensões limitadas ao valor de 3 mm.
Deve ainda apesentar a granulometria preferencialmente contínua, para poder
proporcionar as melhores condições de empacotamento da mistura.
-As adições minerais devem ser
compatíveis com os agregados e o cimento no sentido de se poder proporcionar o
melhor preenchimento dos vazios, e as melhores condições de empacotamento. Ainda,
eles poderão ser esféricos, de modo a se poder reduzir o atrito interno, e
favorecer as condições de fluidificação da mistura.
-Os superplastificantes
utilizados são normalmente os de última geração, constituídos à base de
carboxilatos.
-As fibras deverão ter dimensões
e teor de modo a serem capazes de se inserir na mistura, e não comprometer as
condições de trabalhabilidade, refletindo nisso o comprimento, a espessura ou o
diâmetro equivalente, que compõem o “fator forma”. Ainda, reflete nas condições
de inserção e empacotamento o teor de areia em mistura e as suas condições de
compacidade.
Dentro do que está ilustrado, a
microestrutura do UHPC é conferida no sentido de proporcionar as melhores
condições de desempenho, e beneficiar tanto em termos de reologia do estado
fresco como das propriedades do estado endurecido.
Princípios de dosagem do UHPC
Neste conteúdo se procura apresentar a sequência do método de dosagem conforme compreendido do apresentado em CHRSTIAN, TUTIKIAN e HELENE (2022), referente ao método da UNISINOS.
A seleção de materiais é feita
com base nas recomendações apresentadas no item anterior.
Para os casos das areias se faz a
observação das curvas granulométricas, com fins de escolher os materiais que
irão proporcionar o menor índice de vazios e o maior índice de empacotamento.
Os materiais devem apresentar granulometria contínua e serão evitados aqueles
que apresentarem condições de granulometria muito próximas, visto que não
contribuirão para a redução dos vazios e melhor empacotamento, quando
utilizados conjuntamente.
O processo para estabelecer a proporção
dos materiais e otimização da mistura, segue conforme o que é exposto a seguir.
Este é realizado com base na
adoção de uma mistura ideal, contínua, proposta conforme FUNK e DINGER (1980),
a qual apresenta os valores da porcentagem acumulada para cada dimensão dos
materiais. O procedimento consiste na superposição de curvas, a da referida
mistura ideal, e a curva resultante para a mistura em fase de elaboração e
analise.
É então verificado o desvio entre
os valores acumulados, entre a curva da mistura ideal e a mistura em
análise. A Figura 2 ilustra as curvas e
a superposição.
Figura 2:
superposição de curva ideal e curva da mistura em análise
É definido o Índice de Desvio de
Empacotamento (IDE), verificado conforme a área relativa à diferença entre as
curvas. Quanto menor e insignificante for o valor do IDE, mais próxima estará a
composição em otimização da composição desejada.
Para dar partida ao processo
analítico, se tomam os valores dos diâmetros máximos e mínimos dos materiais a
serem utilizados.
Para a elaboração da curva ideal,
se recorre à seguinte equação1:
PAD/ 100% = (Dq –Dminq
)/ (Dmax q- Dminq ) equação (1)
Onde
Dq representa o
diâmetro em avaliação;
Dminq representa o diâmetro mínimo;
Dmax q representa o
diâmetro máximo.
Já para a mistura em otimização,
conta-se com a seguinte equação 2:
PAD / 100= soma (Q + D retido)
equação (2)
Onde
PAD representa a porcentagem
acumulada referente a cada dimensão para os materiais da composição em
otimização.
Q representa a porcentagem de
cada material na mistura.
D retido representa o
valor retido.
Com base nos valores obtidos
podem se calcular os dados para as curvas de empacotamento da mistura em
otimização, e então ela pode ser comparada com a curva ideal.
Segundo os autores, este cálculo
pode ser realizado com o uso de aplicativos, como o Excel.
Uma vez ajustada a proporção dos
materiais, determina-se o teor de fibras.
O teor de fibras está na
dependência dos seguintes fatores:
Fator fibras, designado pelos
autores por “r”; o qual é determinado pela relação entre o comprimento da fibra
e o valor da espessura da fibra; e ainda se tem que considerar o aspecto da
compacidade da areia, a partir do valor da massa unitária da areia, dada aqui
por M unitária , e o valor de massa específica da areia, definida
por M específica .
Desta forma, o valor do teor de
fibras é dado pela equação 3:
T fibras = 400 / r * (1-
M unitária / M específica) equação (3)
Cumpre considerar que este teor é
definido de modo a não comprometer as condições de trabalhabilidade da mistura,
e deve ser limitado a um teor máximo de 3,0%.
Finalmente, uma vez tendo sido
definida a proporção entre os materiais secos, considera-se a fluidificação da
mistura. Esta é alcançada experimentalmente, com base na ação da água e do
superplastificante.
Os valores da quantidade de água
são pequenos, sendo o papel da água completado com o do superplastificante.
De acordo
com os autores citados, uma referência para o valor da relação água/aglomerantes
é da ordem de 0,21; e o teor do superplastificante deve ser limitado a 3,5% com
relação à massa do aglomerante.
Então se realizam a produção de
misturas, em uma fase empírica, de modo a se alcançar composições desejadas.
Pode, então, com base em
resultados alcançados, produzir o diagrama de orientação de dosagens para os
casos dos materiais utilizados. A Figura 3 ilustra o diagrama.
Figura 3: Diagrama de otimização da mistura
UHPC
Ensaios de validação das misturas frescas
Os ensaios de validação das
misturas frescas são realizados com o propósito de se avaliar as condições de
consistência e de mobilidade das misturas, visando o atendimento aos requisitos
de desempenho.
Normalmente eles assumem as configurações
dos ensaios conhecidos e realizados para argamassas, conforme a NBR 13276:2016,
e para os concretos autoadensáveis, conforme a NBR 15823-2:2017.
Os acessórios são de modo geral
similares, podendo haver diferenças quanto às dimensões ou quanto aos
protocolos de operação.
Para o caso do cone de Abrams,
este apresenta dimensões de 200 +/-2mm de diâmetro inferior, 130 +/-2 de
diâmetro inferior, e 200+-/2 de altura. O preenchimento do cone se dá em duas
camadas e com 10 golpes de aplicação. A retirada do cone se dá em
aproximadamente 4 minutos.
Como referência para o valor do
espalhamento mínimo, estes valores podem variar conforme especificações existentes.
Existem indicações de que ele deve se de pelo menos 760mm para casos de escoamento
livre.
Valores nominais das propriedades de resistência mecânica
Os valores da resistência mecânica do UHPC
podem variar nominalmente conforme o país e a instituição normalizadora. Por
exemplo, para ASTM C1856, EUA, o valor da resistência à compressão é da ordem
de 120 MPa (e não especifica o valor da resistência à tração), já para a
Association Française de Génie Civil (AFGC) o valor de resistência mecânica é apresentado
como 150 MPa para os casos de resistência à compressão, e 7Mpa para a
resistência à tração. Outros valores podem ser vistos em CHRIST (2019).
Aspectos de tecnologia, produção e projeto
O UHPC por envolver diferentes
níveis de energia quando na fase de mistura, requerendo diferentes tempos para
a sua homogeneização, e na dependência da relação água/ aglomerantes. Uma
precaução que se tem com relação à energia de aplicação é com relação à
temperatura alcançada pela mistura, a qual, se elevada, pode provocar fenômenos
como da evaporação elevada e da retração plástica do material.
O UHPC é bastante utilizado na indústria
de pré-fabricados, onde, pode ser explorada a cura térmica, úmida.
Em termos de projeto e sistemas
construtivos o UHPC, é concebido de modo a cumprir o papel de componentes de
estruturas, dadas as suas versatilidades em termos espessuras, geometrias e
rigidez, de tal modo que ele pode ser produzido para componentes de
edificações, pontes e passarelas, cumprindo diferentes papéis na estrutura.
O UHPC não é um concreto de baixo
custo, tendo em vista a presença das adições presentes, o consumo de cimento
por metro cúbico, e a quantidade de fibras incorporadas.
Referências
CHRIST. R; TUTIKIAN. B.F; HELENE. Método
de dosagem Unisinos para UHPC, CONCRETO & CONSTRUÇÕES, 105, 2022, IBRACON,
São Paulo, p.30-33
CHRIST. R; TUTIKIAN. B.F; HELENE. P. Concreto de ultra alto desempenho, São Paulo,
Leud, 2022, 176p.
TUTIKIAN. B.F; ISAIA G.C; HELENE.
P Concreto de alto e ultra alto desempenho, CONCRETO: CIÊNCIA E TECNOLOGIA, 2, IBRACON,
2011, São Paulo, p.1283-1325