sábado, 6 de fevereiro de 2016

ESTUDO DO CONCRETO COMO MATERIAL: O CONCRETO ENDURECIDO



Materiais e estruturas


Marco Antônio de Morais Alcantara

As propriedades desejadas para o concreto endurecido deverão ser atendidas conforme são as exigências para o seu desempenho final, e este poderá estar ainda sujeito às suas contingências peculiares concreto como material. Dentre as exigências para o concreto endurecido têm-se, por exemplo, a resistência mecânica, a durabilidade, a ductilidade, a impermeabilidade; isto conforme o contexto a que a estrutura estará submetida. Pode acontecer que alguns dos fatores sejam mais relevantes do que outros. Então, não obstante as propriedades intríssecas ao material, não se deve deixar de considerar que existe a questão da interação das estruturas com o meio, a qual se torna relevante para com a identificação dos fatores principais que serão tomados como requisitos para as exigências no estudo do concreto endurecido.

Os objetivos desta unidade consistem em apresentar as características do concreto endurecido juntamente com os fatores que podem contribuir para a formação de tais características, e os problemas de desempenho frente á sua atuação e diante da exposição ao meio.


As propriedades do concreto endurecido

Nesta sessão se apresentara as principais propriedades do concreto endurecido, em termos das magnitudes de valores, possíveis relações entre elas, do comportamento e a interação 


Massa específica aparente

Inicialmente pode-se considerar a massa específica do concreto. Esta pode variar conforme tipo de agregado utilizado, e com o processo de adensamento. O valor do material em sua forma final pode variar entre 2300 à 2500 kg/cm3. A massa específica aparente pode indicar a maior ou menor concentração de material e estar correlacionada com a resistência mecânica e com a permeabilidade. 


A resistência mecânica 

Aqui se discutirá sobre os fatores que contribuem para a resistência mecânica do concreto e o comportamento deste diante dos tipos de solicitação.


Resistência mecânica, fatores intervenientes
A resistência mecânica do concreto é uma das propriedades de maior importância, podendo o seu valor variar em função de alguns fatores, divididos inicialmente em: (i) resistência da pasta; (ii) resistência da ligação pasta-agregado; (iii) propriedades do agregado. Cada um destes pode contribuir com uma contrapartida, principalmente considerando o nível de resistência do concreto e os materiais utilizados na fabricação, sobretudo se é o caso de concreto ordinário ou é um caso de concretos especiais.

Estes fatores poderão também sofrer a influências dos demais que são citados a seguir:

a) A relação água/cimento. 

Para os casos de concretos ordinários, o valor da resistência mecânica é determinado pelo valor da resistência da pasta, visto que o valor da resistência do agregado é mais elevado. Dentre os fatores que influenciam no valor da resistência da pasta é a porosidade, e esta está relacionada com a quantidade de vazios desta. Sabe-se que da hidratação do cimento Portland resultam cristais entrelaçados, os quais proporcionam a criação de um arranjo resistente, mas, nem toda água adicionada ao concreto é utilizada pelo cimento para a sua hidratação, visto que o restante dela é importante para se dar a condição favorável ao manuseio do concreto. Esta água deve sair pela evaporação. Os vazios deixados pela saída desta constituem-se em fraqueza para o material concreto.

Deste conceito foi estabelecida a Lei de Abrams, a qual associa os valores da resistência à compressão do concreto com a relação entre a quantidade de água e a quantidade de cimento, a conhecida "relação água/cimento". A figura abaixo procura ilustrar a variação da resistência mecânica com relação à variação da quantidade de água no concreto, em termos das porcentagens com relação aos seus valores máximos.

Variação da resistência mecânica em função do valor da quantidade de água incorporada, com relação aos seus valores máximos

A princípio, o valor da resistência mecânica tende a decrescer com a diminuição do valor da  relação água/cimento, em decorrência das condições de trabalhabilidade que são impostas, induzindo-se o concreto à formação de vazios, "ninhos" e "bicheiras"; contudo, a partir de um dado valor da relação água/cimento, compatível com as condições de manuseio, têm-se que os valores da resistência mecânica do concreto tende a diminuir com o incremento do valor da relação água/cimento, pelas razões já apresentadas. 

Com respeito à Lei de Abrams, algumas considerações são importantes; de que ela foi estabelecida de modo empírico, não levou em conta a resistência em particular dos agregados, e que foi estabelecida para agregados com o diâmetro máximo variando entre 9,5 a 38 mm. É válida para estudos onde se utilizou de um determinado tipo de cimento, assim como de agregado, de modo que o que se preconiza é a relação água/cimento. Esta é apresentada abaixo:




onde; "R" é o valor da resistência mecânica, "x" é o valor da relação água/cimento, e, "A" e "B" são constantes empíricas. 

Não obstante a lei seja genérica, cabe considerar que isto é que foi apresentado é adequado considerando o caso de concretos ordinários, preparados sem o uso de aditivos ou de adições minerais, merecendo então algumas considerações quando no caso de concretos especiais.

Cabe considerar que as condições compatibilidade entre as qualidades do concreto e a relação água/cimento guardam as mesmas relações tanto para os casos do concreto fresco como para o concreto endurecido.

O valor da relação água/cimento pode não só afetar a condição de porosidade da pasta, como influenciar na aderência da pasta ao agregado, pelo possível enfraquecimento da chamada "Zona de transição".

b) A idade. 

Como já foi apresentado, o cimento apresenta ganhos de resistência mecânica crescentes a longo prazo, conforme se desenvolve o processo lento de hidratação interno, e, componentes diferentes do cimento podem apresentar períodos distintos para a contribuição com o ganho de resistência. Em face destes processos, e somadas as suas próprias peculiaridades, o material concreto apresenta ganhos crescentes de resistência mecânica a longo prazo até a sua estabilização. O tempo de 28 dias é o utilizado como referência para caracterizar o ganho de resistência mecânica do concreto.

Existem fórmulas de correlação para se estimar o ganho de resistência mecânica aos 28 dias do concreto, a partir de intervalos menores de tempo. Estas são apresentadas a seguir.




c) Grau de hidratação do cimento:

Como dito no item anterior, o ganho de resistência do concreto é crescente com o processo de hidratação do cimento. A isto pode-se inferir sobre o "grau de hidratação do cimento". O grau de hidratação do cimento implica em uma concentração de sólidos, da qual resulta o ganho de resistência. O volume de sólidos ocorre dentro de determinados limites no interior da pasta. O produto resultante é um sólido poroso, fracamente cristalizado, formando um gel de silicato de cálcio hidratado.

O processo inicia quando uma porção anidro de cimento é dissolvida pela água, formando uma solução, a qual é difundida da superfície de um grão para dentro dos espaços maiores, através dos poros de uma pasta de gel formada. O processo pode depender da finura e da superfície específica do cimento.

Considerando o espaço disponível no interior da pasta e as condições para a difusão interna e o desenvolvimento do gel, pode-se inferir que a relação "fc28/fc7" seja menor para os valores mais baixos da relação água/cimento. 


 d) A influência do tipo dos agregados.
 
Este assunto parece um pouco polêmico. Conforme já apresentados em agregados, os agregados que apresentam granulometria contínua podem ser melhor adensados, e, promovem também melhor condição de manuseio. Quanto à forma, os mesmos atributos podem ser conferidos aos agregados mais arredondados. Por outro lado, para alguns tecnologistas, os materiais britados podem fornecer concretos que apresentam um maior travamento entre os materiais constituintes, e pode-se ainda considerar o tipo de superfície. Os agregados com superfície rugosas permitem melhor aderência à pasta de cimento do que os agregados de superfície lisa. Em um estudo realizado no laboratório da UNESP de Ilha Solteira mostrou que concretos produzidos com agregados britados de basalto apresentara em geral melhores resultados mecânicos do que concretos produzidos a partir do seixo rolado; contudo, houve casos de concretos produzidos com seixo que se apresentara mais resistentes do que concretos produzidos com materiais britados, por causa da relação água/cimento. a aderência do agregado à matriz pode ter um máximo de desempenho quando a relação água/cimento é da ordem de 0,4 e um mínimo quando a relação água/cimento é da ordem de 0,65. 
  
 e) Tipo de cimento. Existem cimentos que apresentam valores nominais de resistência mecânica maiores do que outros, devendo isto ser refletido no concreto. Estas variações estão em razão da composição do cimento.

f) A granulometria do agregado:

A granulometria do agregado pode influenciar em fatores que estejam associados à interface agregado-pasta, em termos da permeabilidade entre a pasta e o agregado, como com relação a concentrações de tensões. Também, a diminuição da superfície específica do agregado pode diminuir a área de adesão entre as fases. 

  g) A presença de adições minerais

  Estas podem atuar por efeito fíler, preenchendo os poros do concreto, e dando melhor ajuste ao esqueleto granular, assim como por ação pozolânica, quando apresentam atividade pozolânica, produzindo compostos cimentantes. No caso da utilização de adições minerais podem ser consideradas as relações "água/cimento" e "água/cimento+finos".  Pode, inclusive, ocorrer de que concretos com valor mais elevado da relação água/cimento apresentem valores superiores do que concretos ordinários, devido à presença de adições minerais, que contribuam, por exemplo, com o efeito pozolânico.

h) Fatores tecnológicos. 

A condição de preparo do concreto e a cura podem implicar significativamente na resistência mecânica deste. Aspectos como a correção da água a se adicionar no concreto (tendo em vista a água já presente nos agregados) podem implicar na relação água/cimento, e esta, na resistência mecânica final.

i) Presença de aditivos:

Os aditivos podem permitir a redução da água a ser incorporada, com relação às condições desejadas de trabalhabilidade, assim como, podem produzir a defloculação e a dispersão do cimento, permitindo melhores condições de hidratação do cimento.

Diferenciação no comportamento mecânico quanto ao tipo de solicitação

O concreto não resiste tão bem aos esforços de tração, como no caso dos esforços de compressão, e esta relação está em aproximadamente dez vezes menor. Isto advém da fragilidade do concreto, mediante suas condições de microestrutura, heterogeneidades, concentrações de tensão e poros. Todavia, tanto a resistência à compressão do concreto como a restência à tração tendem a ser crescentes com o nível de cimentação do material.

Os valores da resistência à compressão axial e da resistência à tração do concreto tendem a apresentar correlação, conforme apresenta a figura a seguir, elaborada com base nos resultados apresentados em Oluokun et al (1991a, para concretos vibrados apresentado diferentes valores da relação água/cimento, porcentagem de agregados e condições apresentadas nos ensaios de abatimento.


Elaboração do autor conforme informações de Oluokun et al (1991a)

Considerando o baixo desempenho do concreto em esforços solicitantes de tração, se pode também facilmente inferir sobre as suas limitações quando em esforços de flexão simples ou composta. 

Propriedades relativas à permissividade ao meio

Agora, vamos passar para o assunto referente à permeabilidade e a absorção do concreto endurecido.
           
Em razão da porosidade do concreto endurecido, relacionada aos vazios existentes no concreto, e somada ainda a característica de higroscopia, o concreto pode estar sujeito à absorção água. Além desta condição natural do concreto, os sais presentes podem contribuir para que este seja ainda mais higroscópico. Quando os vazios são interconectados, o material adquire a condição de ser permeável.

Os meios pelos quais a água pode ter acesso às estruturas podem ser: a filtração sob pressão (i), a difusão interna (ii), e a capilaridade (iii). O fenômeno da ascensão capilar é aquele que ocorre em tubos finos, e, sendo muitas vezes os poros do concreto conectados, estes constituem-se em um canal capilar. 

A difusão é um fenômeno natural de homogeneização da umidade pelo material.

A condição para que o concreto seja menos permeável é que ele seja bastante compacto, e que o processo global envolvendo o seu planejamento e produção seja bem cuidadoso.

A quantidade de água utilizada na fabricação do concreto é muito importante, tendo em vista que, a parte dela além da que é utilizada  para a hidratação do cimento deverá sair do sistema e contribuir para a formação de vazios no concreto. 

O crescimento da permeabilidade com a porosidade varia pouco até certo valor, podendo se tornar exponencial a partir de um determinado valor crítico.

Influência da porosidade no valor da permeabilidade do concreto 


Também, o coeficiente de permeabilidade do concreto endurecido, de modo geral, sofre variação positiva com o aumento da relação água/cimento; observa-se, porém, esta variação é mais acentuada a partir de valores da relação água/cimento acima de 0,5.

Influência da relação água/cimento no valor da permeabilidade do concreto


 O tipo de cimento também é muito importante, tendo-se em vista que alguns tipos de cimentos podem ser mais susceptíveis à apresentar como subprodutos das reações de hidratação a cal hidratada a qual pode ser lixiviada pela água à longo prazo, deixando como consequências vazios no concreto. Outros tipos de cimentos podem apresentar componentes susceptíveis a reações químicas expansivas com elementos presentes no meio, como as reações álcali-agregado e as que conduzem à formação do sulfo-aluminato de cálcio, criando-se também vazios no concreto, e, finalmente, alguns cimentos são menos susceptíveis à retração, por apresentarem um processo de cura mais lento e gradual. Os cimentos de Alto-Forno, por exemplo, requerem mais água nas primeiras idades, devendo a cura ser mais cuidadosa, mas, por outro lado, apresentam menor calor de hidratação e, a longo prazo, apresentam cristais bem entrelaçados.

O tipo de agregado pode ter importância para a permeabilidade do concreto, não só pelo aspecto do arranjo compacto que eles podem proporcionar, diminuindo-se o volume de vazios dos agregados a ser envolto por argamassa, mas também pelos aspectos da aderência. Considera-se neste caso a possibilidade de formação de um filme de água entre este e a argamassa, diminuindo-se a condição de aderência entre este e a pasta favorecendo a passagem da água entre a superfície do agregado e a argamassa. Recomenda-se, então, que se utilize os agregados de modo que a superfície específica destes seja a menor possível.

A preparação da mistura é muito importante. Deve-se prever a compatibilidade entre as condições do concreto ainda fresco e o processo tecnológico, para que não se proporcione a criação de vazios no concreto. A cura deve ser bem cuidadosa para que a retração hidráulica não venha a ser acentuada.


A retratilidade do concreto

A retração do concreto pode ser compreendida sob dois aspectos: antes da pega, e após a pega do cimento. No primeiro caso tem-se a retração hidráulica. A retração hidráulica no concreto tem inicialmente como fatores principais contribuintes o tipo e o teor de cimento adotado, a quantidade de água utilizada para a fabricação do concreto, o enriquecimento do traço ou o tipo de cimento, podendo contribuir para o calor de hidratação liberado, e consequente evaporação acelerada da água. Ainda, as condições externas podem influenciar, como as condições de umidade, e de vento. As condições de exposição a que estiver submetido o concreto são também muito importantes, pois influenciam também na velocidade de perda d’água do material para o meio externo, e, além destes fatores, tem-se a presença do agregado, os quais se opõem á retração. 

Quando a quantidade de água necessária para o manuseio do concreto tende a diminuir, esta poderá se evaporar de forma mau comportada.

A retração térmica ocorre normalmente em razão da elevação de temperatura do concreto pela sua liberação de calor, e com consequente resfriamento. Com relação à retração térmica, cabe relembrar a questão do calor de hidratação do concreto, onde durante uma fase, pode ocorrer a contração da superfície já resfriada concomitantemente com a expansão do concreto interior ainda quente.

Após a pega do cimento, o concreto ainda estará sujeito ao fenômeno de retração, porém, a pasta endurecida tende à resistir ao encolhimento.


Estrutura e ambiente

Outro ponto importante acerca do concreto endurecido é a sua deformação como um reflexo da interação das estruturas com o ambiente.

Os elementos causadores de mudança de volume por natureza ambiental no concreto endurecido são a temperatura e a umidade. O concreto endurecido pode sofrer dilatação ou contração térmica. Um aspecto importante sobre esta questão é que o coeficiente de dilatação do cimento é normalmente maior do que o dos agregados, devendo então ser a expansão crescente para o concreto conforme o crescimento do teor de cimento com relação ao agregado total. Outro aspecto, e preocupante, é que em face desta situação, pode ser caracterizada uma forma de intemperismo ao material concreto.

Considerando o concreto como uma pedra artificial, deve-se levar em consideração também os ciclos de absorção e secagem, os quais são mais preocupantes para estruturas expostas.

Os ciclos de absorção e secagem, e os da retração e expansão térmica são muito preocupantes para o concreto endurecido, visto que eles introduzem tensões internas no concreto. Estas podem levar o material à microfissuração e, com o aumento da permeabilidade, posterior desagregação interna.


A rigidez dos concretos

É importante lembrar que, com o endurecimento do concreto, este adquire o comportamento de material rígido, com elevado módulo de elasticidade, e baixa capacidade de deformação. Com o aumento do valor do módulo de elasticidade, os materiais tendem a adquirir um comportamento frágil na ruptura. O módulo de elasticidade é definido pela relação entre a variação na tensão aplicada, pela variação da deformação percebida. Uma peculiaridade para o material concreto, é que o módulo de elasticidade deste pode sofrer variações com o nível de tensão e de deformação, conforme a Figura 01 abaixo. Distinguem-se os seguintes valores, quando considerada a curva tensão versus deformação: o "módulo secante", definido pelo valor da relação entre a tensão e a deformação em determinado ponto, o "módulo tangente", definido pela inclinação da curva tensão x deformação no determinado ponto e, a inclinação da curva tensão x deformação na origem é o "módulo tangente inicial".

Representação esquemática da relação entre a tesão e a deformação do concreto Fonte: Neville (1997)


O módulo de elasticidade do concreto também varia com a relação água/cimento, sendo ainda influenciado pelo tipo e a porcentagem do agregado graúdo, da quantidade de pasta e das condições de consistência.

Os valores do módulo de elasticidade e da resistência à compressão do concreto tendem a apresentar correlação, conforme apresenta a figura a seguir, elaborada com base nos resultados apresentados em Oluokun et al (1991b), para concretos vibrados apresentado diferentes valores da relação água/cimento, porcentagem de agregados e condições apresentadas nos ensaios de abatimento.


Elaboração do autor conforme informações de Oluokun et al (1991b)


Contrapartidas dos agregados e da pasta na resistência do concreto endurecido

Do ponto de vista das partes que constituem o concreto, tanto a pasta endurecida como os agregados apresentam variação linear e deformação com relação ao valor da tensão, conforme ilustra a Figura seguinte, de Neville (1987), com o concreto apresentando um valor de módulo tangente inicial intermediário e um comportamento não linear. A razão da curvatura no material concreto é atribuída às microfissuras que surgem nas interfaces dos agregados com a pasta, diminuindo a área efetiva que resiste às cargas. Neste processo, as microfissuras podem evoluir rapidamente, e desta forma o valor da deformação aumenta em razão muito maior do que a da tensão aplicada. 

 Curvas tensão deformação da pasta de cimento, do agregado e do concreto Fonte: Neville (1997)

Ao se considerar o concreto como um compósito entre diferentes fases, surge a importância entre a aderência entre as duas fases, de modo que, o tipo de agregado e a natureza da pasta de cimento se tornam relevantes. Quando mais rugosa for a superfície do agregado, mais favorecida será a aderência entre os agregados e a pasta, assim como, a natureza da pasta. A permeabilidade do concreto também pode ser influenciada pelo tipo de agregado e pela natureza da pasta, de modo a se pode haver caminhos preferenciais para a percolação da água e comprometer a aderência bem como a dissolução de materiais e o aumento consequente desta permeabilidade. Neste sentido, o seixo rolado tem sido penalizado pelo fato de apresentar superfície lisa (não implicando em que este seja reprovado para o uso em concretos).

Um fato curioso é o do volume de agregados por volume unitário de concretos. Se por um lado a compacidade do concreto pode ser aumentada pelo aumento do teor de concreto, tem-se ainda de acordo com a interação entre a pasta e os agregados, deve haver um volume mínimo de argamassa de modo a se poder recobrir os agregados.

As tensões de aderência são também relevantes quando se trata da interação entre o concreto e a armadura, quando no caso de concreto armado. Esta pode variar para o concreto em função do confinamento das armaduras, da natureza da pasta de cimento, do valor da resistência à compressão do concreto, da natureza das superfícies das armaduras, como no caso de lisas ou corrugadas, e do sentido da concretagem com relação à posição das barras.
  

Concreto de elevado desempenho

Os concretos de elevado desempenho são produzidos a partir do uso de valores baixos da relação água/cimento, e com o uso de adições minerais. Ele é viabilizado com o uso de superplastificantes. Em face do baixo valor da relação água/cimento eles tendem a apresentar valores elevados de resistência mecânica, baixa retratilidade, elevada densidade, de modo a também apresentar boa durabilidade. A partir de então se torna também possível a utilização de pilares de seções menores, implicando em maior versatilidade em projetos e menor volume de concreto utilizado. Se para o caso dos concretos ordinários um concreto apresentando da ordem de 30 MPa é um concreto muito resistente, os concretos de elevado desempenho apresentam valores nominais de resistência à compressão simples a partir da ordem de 40 MPa, podendo variar até 80 MPa. Se para o caso dos concretos ordinários os agregados são os elementos que respondem pela maior contrapartida para com a resistência mecânica, para os casos dos concretos de elevado desempenho a pasta endurecida apresenta valor significativo, de modo que a ruptura pode se dar também na fase dos agregados.


A fragilidade dos concretos

Dentro dos níveis de tensão aplicados em obras correntes, os concretos mais resistentes apresentam menor deformação específica, conforme figura a seguir. Se por um lado eles são bastante rígidos, por outro isto faz com que eles se tornem mais frágeis. O carácter dúctil é importante para o desempenho, especialmente em casos de eventos onde se tem esforços não esperados de flexão. Esta é uma das razões pelas quais se adota hoje com mais frequência o uso de concreto com fibras.  


Exemplos de curvas tensão-deformação de corpos de prova de cilíndricos de concreto com resistência de até 85 MPa. Fonte: Neville (1997)

São então preocupantes os esforços de flexão induzidos no concreto, não previstos pelo projetista. Esforços adicionais que podem atuar no concreto são, por exemplo, os decorrentes de esforços reativos em estruturas hiperestáticas, os recalques de fundações, e as cargas adicionais, não previstas no projeto. Ainda os sismos são preocupações cada vez mais frequentes no mundo. Neste sentido a ductilidade do concreto tem-se tornado um fator importante para os concretos atuais.

As fibras são as responsáveis pelas melhorias do comportamento do concreto quanto á ductilidade. Estas atuam como pontes de transferência de esforços entre partes fissuradas do concreto. O desempenho destas pode variar quanto à porcentagem, comprimento de fibras, natureza e propriedades mecânicas. O concreto com fibras não tem incrementado o seu valor de resistência à compressão, contudo tem incrementado o valor da energia absorvida na ruptura, ou seja, o aumento da tenacidade.  
 

A fenomenologia das deformações instantâneas e das causadas por carregamentos de longa duração 

Podemos admitir dois tipos de deformação para o concreto. No primeiro caso temos as deformações instantâneas, e no segundo, as deformações lentas causadas por carregamento mantido à longo prazo, podendo também considerar que o carregamento esteja acima de determinado valor, com relação à carga de ruptura. Dá-se o nome de “fluência”, à deformação lenta do concreto, permanente, causada por sobrecargas com maior tempo de duração, à longo prazo.

A soma das deformações à longo prazo envolve as deformações instantâneas criadas e as deformações provocadas pela fluência.

Quando é aplicada a carga equivalente, por exemplo, à metade do carregamento de ruptura, o concreto se torna um material no estado plástico, de maneira que, quando aplicado o descarregamento, permanece uma deformação residual, isto é, permanente.

A parcela referente à deformação instantânea é recuperada imediatamente após o descarregamento,, enquanto que a parte recuperável devido à fluência é retornável dentro de um regime variável com o tempo, obedecendo á um regime transiente.

Carregamento e descarregamento de corpo de prova e as deformações instantâneas e à longo prazo



Bibliografia:

ALCÂNTARA, M. A. M. Bétons auto-plaçants et fibrages hybrides: composition, rhéologie et comportement mécanique. 2004. 192f. Tese (Doutorado em Engenharia Civil) – Institut National des Sciences Appliquées – INSA, Toulouse, 2004.

BAUER, L.A.F. Materiais de Construção. vol. 1. Rio de Janeiro: LCT. 1994. 531p.

NEVILLE, A. M. Propriedades do Concreto. São Paulo: Pini, 1997, 828p.

OLUOKUN, F.A; BURDETTE, E.G; DEATHEARAGE, J.H. Spliting tensile strength and compressive strengrh relationship at early ages. ACI MATERIALS JOURNAL, no. 88-M14, March-April, pp. 115-121, 1991a

OLUOKUN, F.A; BURDETTE, E.G; DEATHEARAGE, J.H. elastic modulus, Poissons's ratio, and compressive strength relatioships at early ages. ACI MATERIALS JOURNAL, no. 88-M14, January-February, pp. 3-10, 1991b

PETRUCCI, E. Concreto de Cimento Portland, São Paulo, Globo, 1980.

SOBRAL, H.S. Propriedades do concreto endurecido. Estudo técnico, B.T 61, Associação Brasileira de cimento Portland, 1984, 45p.



Sobre o autor:

Marco Antônio de Morais Alcantara é Engenheiro Civil formado pela Universidade Federal de São Carlos-BR, com ênfase em Engenharia Urbana (1986); Mestre em Engenharia Civil, área de concentração em Geotecnia, pela Universidade Federal de Viçosa-BR (1995); Master Génie Civil, Matériaux et Structures, pelo Institut National des Sciences Appliquées de Toulouse-FR (2001); Docteur Génie Civil, Matériaux et Structures, pelo Institut National des Sciences Appliquées de Toulouse-FR (2004);  e tem pós-doutorado em Estruturas pela Universidade do Porto-PT (2012). É docente da FEIS/UNESP desde 1987.