sexta-feira, 11 de setembro de 2020

CONCRETO AUTOADENSÁVEL : ALGUMAS CONTINGÊNCIAS DESDE O LABORATÓRIO ATÉ À OBRA

 


Marco Antônio de Morais Alcantara

O concreto autoadensável foi concebido de modo a poder tirar partido das condições de execução. Este tipo de material deve atender rigorosamente a propriedades particulares do estado fresco, de modo a poder auto adensar-se sob a ação do seu peso próprio, sem a necessidade de vibração. Em linhas gerais, estas propriedades são compreendidas como: (i) boas condições de fluidez, ausência de segregação e de exsudação (habilidade de preenchimento  estabilidade), (ii) e ausência de bloqueios diante de condições de confinamento, ou de obstáculos construtivos (habilidade passante). Tendo por finalidade verificar o atendimento dos concretos aos citados requisitos do estado fresco, alguns ensaios de validação no concreto fresco são então realizados, podendo estes ser feitos tanto no laboratório, para fins de otimização das composições, como na obra, para se verificar a conformidade com relação ao que eles foram concebidos. Uma problemática surge quando na reprodução do concreto para a obra, e a sua manipulação até chegar lá, de modo a se manter em conformidade a qualidade do concreto, sendo isto o escopo deste estudo.

 

Ensaios de validação do concreto fresco:

 

O recebimento do concreto autoadensável na obra é prescrito pela ABNT NBR 15823-1:2017. A seguir são apresentados os ensaios de validação, em termos da configuração que eles buscam, diante das contingências da obra. Os mesmos ensaios são realizados quando em estudos de otimização dos concretos.


Ensaios de espalhamento (Slump flow)

Como objetivos, o ensaio de espalhamento (Slump flow) tem por finalidade avaliar a habilidade do concreto em espalhar sob a ação do seu peso próprio, envolvendo distâncias, em compatibilidade com o tempo. Este ensaio é normalizado pela ABNT NBR 15823-2:2017. Os acessórios para a realização do ensaio são: uma placa metálica lisa e perfeitamente nivelada, o cone de Abrams, (o mesmo que é utilizado para os ensaios de abatimento, Slump test), e um cronômetro.

Os procedimentos para a realização do ensaio consistem em: (i) preencher o cone de Abrams; (ii) elevar o cone, (iii) permitir que o concreto ganhe uma nova configuração, sob a ação do seu próprio, a qual tende a se dar na forma de um círculo. A Figura 1 ilustra o ensaio. Uma vez realizado o procedimento, seguem as seguintes ações: (i) medir os diâmetros de espalhamento alcançados pelo concreto, segundo duas direções particulares, normalmente perpendiculares;(ii) fazer inspeção visual da superfície de espalhamento, observando as seguintes condições: a regularidade da superfície, a homogeneidade da superfície quanto à distribuição dos agregados graúdos; ainda uma observação importante é quanto à possível presença de halos d’água em torno da superfície.

 

Figura 1: Ensaio de espalhamento do concreto

A concentração de agregados no centro da superfície pode ser um indicativo de tendências à segregação e bloqueios quando na passagem por obstáculos, a isto se denomina o Índice de Estabilidade Visual”, enquanto que, a presença de halos d’água em torno da superfície de espalhamento pode dar indicativos de que a água está em excesso; a ausência do halo d’água pode dar o indicativo de boa retenção de água. A Figura 2 procura ilustrar. Ensaios complementares podem ser recomendados, como os de segregação.

Figura 2: Ninhos e halos em torno da superfície de espalhamento

O ensaio de espalhamento permite também avaliar as condições de fluidez do concreto, através da medida do tempo conhecido como T500 (mm), dado em segundo. Este representa o tempo para que o concreto demore para alcançar o escoamento dado pela abertura de 500 mm.

Os Quadros 1 e 2 apresentam as classificações que podem ser atribuídas ao concreto em função das faixas de valores encontradas nos diâmetros de espalhamento e nos tempos T500 (mm).

Quadro 1: Classificação de acordo com os valores alcançados no escoamento

Classe

Valor do espalhamento (mm)

SF1

550 a 650

SF2

660 a 750

SF3

760 a 850

 Quadro 2: classificação quanto ao tempo de escoamento, podem ser consideradas as seguintes classes, de acordo com a NBR 15823-2:

Classe

T500 (s)

VS1

</= 2

VS2

>/= 2

 

Uma coisa interessante, é que do valor T500 pode se ter inferências sobre as condições de viscosidade plástica do concreto. Dentro destas condições, se pode configurar o seu escoamento em termos das seguintes condições: se a viscosidade do concreto é baixa, o escoamento se dará mais rápido, de curta duração, enquanto que, no caso de a viscosidade ser maior, o escoamento se dará por um período mais prolongado, e de modo mais progressivo. No caso do T500 ser muito abaixo com relação ao valor apresentado como referência, a composição deve ser reavaliada, e o mesmo se considera quando o valor tende a ser muito maior.

De acordo com Repette (2011), o valor do T500 deve preferencialmente estar situado entre 2 e 5 (s).  

Algumas recomendações podem ser feitas com base nas condições do concreto e as aplicações em estruturas. Estas podem ser apresentadas nos Quadros 3 e 4:

 

Quadro 3: Recomendações para aplicação de concretos autoadensáveis conforme os enquadramentos fornecidos pelo ensaio de espalhamento, diâmetro de espalhamento 

Classe

Recomendações

Tipos de obras

SF1

Para casos de estruturas não armadas ou com baixa taxa de armadura; estruturas que exijam curta distância e espalhamento horizontal

Lajes, revestimentos de túneis, estacas para fundações

SF2

Casos gerais utilizados na construção civil.

Paredes, vigas, pilares

SF3

Estruturas com alta densidade de armadura ou caso de forma arquitetônica complexa

Pilares parede, paredes-diafragma e pilares

 

Quadro 4: Recomendações para aplicação de concretos autoadensáveis conforme os enquadramentos fornecidos pelo ensaio de espalhamento, tempo T500 mm 

Classe

Aplicações

VS1

Elementos estruturais com alta taxa de armadura (Com o controle sobre a segregação e à exsudação)

VS2

Obras correntes

  

 Os ensaios J

O objetivo deste ensaio é de verificar o comportamento do concreto diante do escoamento sujeito à presença de obstáculos. Pode-se inferir sobre a possível influência destes obstáculos.

Este é prescrito conforme a ABNT NBR 15823-3:2017. De modo geral, um anel metálico com 300 mm de diâmetro, 120 mm de altura, e 16 barras de aço com 10 mm de diâmetro, ao longo do perímetro. Este anel é posicionado do modo concêntrico ao cone, de modo que o concreto tenha que superar o obstáculo ao longo do escoamento. A Figura 3 procura ilustrar.

Figura 3: Ensaio de espalhamento com interferência do anel J 

Para a avaliação são considerados dois casos: o fluxo sem a interferência do anel, e o fluxo com a interferência do anel J. toma-se em consideração a diferença entre os valores, de modo a poder ter uma ideia da resistência do concreto em vencer obstáculos. Alcantara (2004) apresenta um estudo comparativo com o uso de fibras metálicas curtas, de polipropileno e em fibragem mistas, tomando em consideração à uma composição de referência sem fibras.  As perturbações decorrentes do anel J se deram em conformidade com a condição de viscosidade destas.

 

Ensaio da caixa em L

Os objetivos do ensaio da caixa em L consistem em avaliar a habilidade passante do concreto diante dos obstáculos tais como os causados pelas armaduras, ou os espaços entre a armadura e as paredes das formas. Por habilidade passante se compreende como a capacidade de fluir ser perder a homogeneidade ou sofrer bloqueios diante das contingências causadas pelos confinamentos.

O ensaio é prescrito pela ABNT NBR 15823-4:2017. O aparato utilizado consiste em uma caixa com a forma em “L”, dotada de uma parte vertical e de outra parte horizontal. A parte vertical tem uma abertura na parte inferior, uma comporta para represar o concreto durante o preenchimento da parte vertical caixa, e armaduras compostas normalmente por 3 barras, cujo diâmetro é de 12,5 mm, que deverão promover o obstáculo. A Figura 4 ilustra a caixa em L.

 

Figura 4: Caixa em L

O concreto é colocado dentro da caixa de contenção, enquanto um operador mantém a comporta fechada. Uma vez dado o sinal do primeiro operador, a comporta é aberta, conduzindo ao concomitante escoamento do concreto, através da abertura. São então medidas as alturas do nível do concreto. A altura do concreto na caixa de contenção, vertical, é dada por H1, e a altura na caixa horizontal é dada por H2. A Figura 5 ilustra a possível configuração final após o escoamento pela caixa em L.

 

Figura 5: H2 e H1 após o escoamento

Considerando as geometrias da armadura e do elemento estrutural, o Quadro 6 apresenta as classes de resultados para este tipo de ensaio, conforme a ABNT NBR 15823-4:2017.

 

Quadro 6: Classes de resultados para os ensaios da caixa em L

  Classe H2/H1

Condição de H2/H1

Concretos recomendados

PL1

>/=0,8 (com duas barras de aço)

Elementos estruturais com espaçamento de armadura de 80 a 100 mm, como nos casos de lajes, painéis e elementos de fundação

PL2

>/=0,8 (com três barras de aço)

Aplicações correntes em elementos estruturais que apresentam espaçamento de 60 a 80 mm; casos que envolvem vigas, pilares, tirantes e elementos da indústria de pré-moldados

 

O acúmulo de agregado junto ás barras indica que o concreto apresenta baixa resistência ao bloqueio, por causa da baixa viscosidade ou dos agregados com dimensões além do conveniente. Quando H2/H1 é próximo de 1, o concreto é dito por “auto-nivelante”.

 

Ensaios do funil (V-funnel)

O ensaio do funil, “V-funnel”, tem por finalidade avaliar a aptidão do concreto em escoar diante de situações tais como nos casos de estreitamento de seção, em contingências que criem confinamento, assim como ele é um ensaio que fornece indiretamente as condições de viscosidade do concreto. Por este ensaio pode-se ainda considerar as possibilidades da ocorrência de casos extremos, como de bloqueios e impedimento de fluxo.

Os protocolos do ensaio consistem em fazer escoar uma quantidade de aproximadamente 10 l de concreto por um funil, e em medir o tempo de fluxo decorrente deste escoamento. A Figura 6 ilustra o funil.

Figura 6: Funil utilizado nos ensaios

A norma que regulamenta o ensaio é a ABNT NBR 15823-5:2017, e estabelece os resultados, de modo a se enquadrarem e duas classes: VF1 e VF2.

Estes são conforme o Quadro 5.

Quadro 5: Enquadramento para os resultados de escoamento através de funil

Classe

Funil (s)

VF1

<9

VF2

9 a 25

  

As classes de ensaios dadas por VF1 e VF2 guardam relação com as classes VS1 e VS2, para os casos de ensaios de espalhamento.

Um cuidado que se deve ter é que o ensaio do funil deve ser iniciado logo após o preenchimento do funil, de modo a se evitar a segregação.   

 

Ensaios de segregação

A segregação é um dos itens indesejados para o concreto autoadensável, e de riscos. Ela pode ser compreendida segundo dois tipos: a segregação dinâmica e a segregação estática. A primeira delas se refere aos casos quando este está em movimento, como nos lançamentos do concreto. Também se pode considerar os casos de problemas de restrições, quando na passagem de obstáculos. Nos casos de o concreto estar em movimento, estes problemas estão associados à baixa coesão interna do concreto, a qual pode ser compreendida como a coesão do material no estado “desestruturado”.

A coesão estática, por sua vez, está associada à descida dos agregados por sedimentação, ou também o afloramento da água, fenômeno conhecido como exsudação.

Os ensaios preconizados tratam preferencialmente dos riscos da segregação estática.

Estes ensaios envolvem a separação de agregado no estado fresco, a lavagem e peneiramento das porções de concreto, após determinado período de tempo, da ordem de 15 a 20 minutos.

O método preconizado pela ABNT é o método da coluna de segregação, prescrito conforme a ABNT NBR 15823-6:2017. Para tanto, uma coluna de 660 m de altura e 200 mm de diâmetro é constituída a partir de 3 seções, uma superior com 160 mm, outra inferior com 160 mm, e uma intermediaria com 330 mm. A Figura 7 procura ilustrar  a coluna.

Figura 7: Coluna de segregação

Preenche-se o conjunto com 20 litros de concreto, e deixa-se esperar pelo tempo de 20 minutos. Após o tempo decorrido, são extraídas a parte superior e a parte inferior, faz-se a lavagem do material e a separação dos agregados. Após a secagem dos agregados peneirados, avalia-se a massa dos agregados e aplica-se a fórmula:

SR=[2(MB-MT)/(MB+MT)]/100

Esta fórmula estabelece como tolerância o valor de até 20% para que o concreto seja considerado estável.

Uma consideração importante é que o tempo de 20 minutos para a espera na realização dos ensaios é preocupante com o tempo da obra, acarretando atrasos no lançamento e na concretagem.

Em decorrência das dificuldades de se realizar os ensaios na obra, ele é muitas vezes realizado de modo visual, através dos ensaios de espalhamento.

 

Reometria do concreto autoadensável

A busca de um regime de escoamento.

De modo geral o ensaio de reometria não é utilizado como um ensaio de validação, sendo mais u8m ensaio para laboratório de pesquisas, na compreensão do comportamento reológico do concreto autoadensável.

Os parâmetros de reologia são obtidos por auxílio de equipamentos denominados por reômetros.

De modo geral o concreto autoadensável é compreendido como do tipo binghamiano, possuindo tensão de escoamento e viscosidade plástica. A tensão de escoamento tem como referência valores da ordem de 70 Pa, e a viscosidade plástica varia entre 10 e 120 MPa.

Algumas dificuldades têm sido encontradas para os ensaios de reometria, tais como a escassez de aparelhos e mesmo havendo alguns equipamentos, existe a inexistência de um equipamento padrão, de modo a se poder realizar comparações.

De um modo geral, para os casos do concreto autoadensáveis os valores da tensão de escoamento são menores do que para os casos de concretos convencionais, e os valores da viscosidade plásticas são mais elevados, comparando com os casos dos concretos convencionais.

Algumas correlações têm sido feitas com relação aos parâmetros reológicos e os ensaios de trabalhabilidade. Por exemplo, quanto maior é o valor do espalhamento, menor é a tensão de escoamento; assim como, quando T500 mm e tvf aumentam, maior é a viscosidade do concreto.


Alguns procedimentos sistemáticos em obra, com relação aos ensaios

Uma das preocupações que se tem em obras é a agilização para a concretagem. Uma agenda é então aplicada com relação aos ensaios. De modo geral, é realizado o ensaio de espalhamento, “slump flow”, para todos os caminhões, enquanto que os demais ensaios são realizados somente para o primeiro caminhão betoneira.

O Quadro 7 apresenta os indicativos da necessidade de ensaios para o concreto autoadensável fresco em função de sua aplicação, com base em informações de Cabral et al (2019).

 

Quadro 7: Ensaios requeridos para o concreto autoadensável

Parâmetro

Ensaio

Requisitos de aceitação

Norma

Fluidez e escoamento

Espalhamento (SF)

Para todas as aplicações

NBR 15823-2:2017

Viscosidade plástica aparente

T500 (VS)

Para todas as aplicações

Pelo fluxo confinado pelo funil V (VF)

A depender da função da aplicação

NBR 15823-5:2017

Habilidade passante

Anel J (PJ)

Para todas as aplicações

NBR 15823-3:2017

Sob fluxo confinado pela caixa em L (PL)

A depender do tipo de aplicação

NBR 15823-4:2017

Sob fluxo confinado pela caixa em U (PU)

Resistência à segregação

Coluna de segregação (SR)

A depender da função da aplicação

NBR 15823-6:2017

Método da peneira (facultativo) (TP)

 

 

 Algumas contingências da execução do concreto autoadensável

Nesta sessão se verá algumas coisas relativas ao histórico e trajetória do concreto, desde a produção até o lançamento, e como o concreto poderá conserva a sua homogeneidade e as suas propriedades reológicas.

 

Controle da produção: A dosagem e o preparo

O concreto autoadensável é bastante sensível diante das variações de dosagens; é marcado por apresentar composições bastante pontuais. Quando uma composição é otimizada, as dispersões podem trazer repercussões que podem inviabiliza-lo totalmente enquanto concreto fresco. Alcantara et al (2004) apresentam possíveis dispersões que podem trazer consequências graves: os desvios com relação à quantidade de água, os desvios com relação à dosagem do superplastificante, e os desvios com relação à quantidade dos materiais finos. Cabe lembrar que a quantidade de superplastificante incorporada ao concreto é limitada à um valor, recomendado pelo fabricante, visto que, caso este valor seja excedido, o concreto estará sujeito à riscos de segregação ou exsudação, mediante o menor desvio da quantidade de água incorporada.

Os excessos de água podem advir da água de umidade dos agregados, da água de lavagem do balão do caminhão da concreteira, além de possíveis erros na tomada da água.

Deve-se então ser precisos quanto à avaliação do teor de umidade dos agregados, assim como estar atento às especificações dos fabricantes de aditivos superplastificante, em especial com relação à geração e recomendações dos produtos, e com às suas finalidades.

Não se recomenda propagandear a afirmação errônea de que o concreto autoadensável não exige a utilização de mão de obra especializada. No mínimo, os depoimentos afirmam sobre a necessidade de treinar a mão de obra.  

Quanto aos equipamentos, deve-se tomar em consideração de que os contextos de mistura são diferentes, como por exemplo a energia das pás dos misturadores das concreteiras, ou dos caminhões betoneiras. Alguns ajustes devem ser realizados, com algumas adaptações nas composições.

 

O transporte

As preocupações para com o transporte envolvem a preservação da homogeneidade e a conservação das propriedades reológicas.

Algumas considerações devem ser tomadas, em especial quanto à segregação, dentro da homogeneidade do concreto. A trepidação do caminhão pode causar a segregação pela sedimentação dos agregados graúdos.

Em termos da condição de fluidez do concreto durante o transporte, não são negligenciados os riscos de vazamento do concreto, se transportados como autoadensável, em especial quando em rampas nas vias, durante o transporte. Também deve se conter a evaporação da água do concreto, o que pode alterar as propriedades do concreto. 

Um outro aspecto é o tempo decorrido pelo transporte. Neste sentido se considera a preservação das condições reológicas requeridas pelo concreto, visto que elas se modificam ao tempo, sendo este assunto até um tema para estudos de reologia do concreto.

As contingências de fluidez para as condições de um caminhão betoneira podem trazer restrições quanto ao seu volume transportado, no sentido de se preservar as qualidades do concreto.

Em decorrência das preocupações apresentadas, de modo a abordar os problemas, muitas vezes o concreto vai para a obra na condição de concreto vibrado, com um aditivo plastificante, sendo então, fluidificado na obra, antes do lançamento, sendo transformado para concreto autoadensável. Para tanto, é fixada uma condição de trabalhabilidade para a saída do caminhão, com um valor de abatimento determinado, da ordem de 10. 

Evidente que o estudo de otimização em dosagem no laboratório, a correção do traço e concreteira, e a transformação do concreto do estado de concreto vibrado bem como a sua fluidificação e transformação em concreto autoadensável deve estar compatibilizada atráves dos estudos técnicos.  

Quanto ao transporte na obra, o bombeamento do concreto pode ser uma alternativa adequada, pois agiliza quanto ao tempo, e ainda, o concreto autoadensável normalmente atende aos requisitos para este tipo de concreto.

 

O controle sistemático do lançamento

Alguns aspectos são de extrema importância desde o início desta atividade.

Como para qualquer outro tipo de obra, o acesso dos caminhões à obra é um fator importante, tendo em vista a conservação das propriedades do concreto fresco. Os atrasos dos caminhões à obra devido ao percurso também são preocupantes, e ainda, deve se considerar as atividades de fluidificação do concreto na obra e os ensaios sistemáticos de validação.

Estas preocupações com relação ao tempo para o início do lançamento não só se justificam em decorrência da conservação das propriedades reológicas do concreto, como também, quanto à concretagem, no sentido de não se criar juntas, e se prejudicar a aderência entre o concreto já lançado e o que está em lançamento.

Algumas diferenças com relação ao concreto vibrado e o autoadensável são manifestadas nas formas. Uma delas é a massa específica aparente do concreto autoadensável, que normalmente à maior do que à do concreto vibrado; outra é a fluidez, que permite preencher as formas em um tempo muito menor. Isto faz com que a pressão hidrostática sobre as formas seja significativa para o caso dos concretos autoadensáveis.

De acordo com Repette (2011), as pressões laterais nas formas dependem dos seguintes fatores: da massa específica do concreto, das dimensões das peças, da tensão de escoamento, da velocidade de estruturação do concreto, da velocidade de concretagem e da altura do concreto na forma. Ainda de acordo com o autor, após o lançamento, as pressões laterais nas formas tendem a diminuir, em especial devido ao ganho de consistência do concreto, de tal modo que o concreto passa a se suportar. Ainda de acordo com o autor, para obras correntes, casos de lajes e vigas de até 60 cm de altura, as formas podem ser as mesmas, tanto para casos de concretos autoadensáveis como de vibrados.

A estanqueidade das formas também é um aspecto muito discutido, de modo a se considerar a vedação das juntas das formas com algum material adesivo.

Ainda, devido à fluidez e da tendência do concreto autoadensável ao auto nivelamento, existe a necessidade de se fazer a sua contenção, de modo que ele escoe pelos limites definidos. É o caso, por exemplo, de desníveis em lajes. A contenção pode ser feita, por exemplo, com madeira compensada.

Com relação à segregação provocada pela condição de lançamento, esta irá depender do nível de coesão interna do material “desestruturado”, que é o caso de coesão para o concreto quando em atuação dinâmica (Diferente da coesão do material “estruturado”, quando ele está em repouso). Para o caso do concreto autoadensável, pelo seu nível maior de coesão interna com relação ao vibrado, pode haver até maior segurança para os casos de lançamento com relação à altura da ordem ou acima de 2,00 m. Serra (2016) apresenta um exemplo de caso onde, diante um vazamento do concreto através de formas, observou-se que o concreto “caído” da altura do pé direito ainda mantinha coesão e integridade. De acordo com Repette (20111), o concreto autoadensável pode sofrer queda de até 5 m e movimentação horizontal de até 7 m.

O nivelamento do concreto normalmente é requisitado para os casos de produção de lajes. Neste caso o serviço pode ser realizado facilmente por um operário, com simples acessórios.

Restrições podem ser impostas para os concretos autoadensáveis dentro dos seguintes casos, e que são aqueles onde a fluidez não é desejada: escadas moldadas no local, vigas invertidas, rampas, desníveis e rebaixos não confinados por formas de lajes.

Não se deve ignorar que durante os protocolos do recebimento do concreto autoadensável existe a tomada de materiais para o controle tecnológico do concreto. Cabe aqui considerar que o controle tecnológico do concreto autoadensável, no estado endurecido, é realizado dentro dos mesmos moldes e protocolos que os que são adotados para o caso dos concretos vibrados.

 

Bibliografia

 

ALCANTARA, M.A.M. Bétons auto-plaçants et fibrages hybrides: Composition, rhéologie et comportement mécanique.  Toulouse, 2004, INSA, 192 p. (Tese de doutorado)

ALCANTARA, M.A.M; MOURET, M; PONS, G; GRANJU, J.L. Concreto autoadensável com adição de fibras metálicas-parâmetros de dosagem e características no estado fresco e endurecido. In: Congresso Brasileiro do Concreto, 46, Florianópolis. Proceedings...Anais, 2, IBRACON, 2004, pp.498-511

 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15823-1: Concreto autoadensável Parte 1: Classificação, controle e recebimento no estado fresco. Rio de Janeiro, 2017

 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15823-2: Concreto autoadensável Parte 1: Determinação do espalhamento, do tempo de escoamento e do índice de estabilidade visual-Método do cone de Abrams. Rio de Janeiro, 2017

 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15823-3: Concreto autoadensável Parte 3: Determinação da habilidade passante-Método do anel J. Rio de Janeiro, 2017

 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15823-4: Concreto autoadensável Parte 4: Determinação da habilidade passante-Método da caixa em L e da caixa em U. Rio de Janeiro, 2017

 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15823-5: Concreto autoadensável Parte 5: Determinação da viscosidade-Método do funil. Rio de Janeiro, 2017

 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 15823-6: Concreto autoadensável Parte 6: Determinação da Resistência á segregação-Método da coluna de segregação e da peneira. Rio de Janeiro, 2017

CABRAL, A.E.B; MOURÃO, C.A.M; COSTA, A.C.S.S; TORRES, J.R; MONTENEGRO FILHO, M.S. Concreto autoadensável: Estudo comparativo com o concreto plástico em edificações verticais. Fortaleza, Edição do autor, 2019, 80p.

REPETTE, W.L. Concreto autoadensável, Concreto, Ciência e Tecnologia, São Paulo, IBRACON, 2011, pp. 1769-1806 

SERRA, J.H.F. Avaliação da avaliação do concreto autoadensável em uma obra de edificação vertical, Fortaleza, 2015, Universidade Federal do Ceará, (Dissertação de mestrado)